Não. Não era amor o que sentiu pelo cantor de boleros. Nunca foi.
De pé, no terraço, sente-se pairar sobre as casas. Abraça o corpo no frio da noite de Curitiba. A visão do Cruzeiro do Sul no céu límpido aumenta-lhe a sensação de estranheza.
O navio deixou-os em Buenos Aires. Lembra-se de atravessar o Atlântico num estado de euforia que chegou a confundir com felicidade. Cada dia era uma descoberta, do cantor (quis ser jogador de futebol mas uma degeneração do menisco impediu-o, isso e a falta de talento para o desporto; a desculpa do joelho vinha a calhar e a bengala ajudava ao estilo) e de si própria.
Continuava a olhar o sexo com um interesse de entomologista. O cantor abrira nela diques que já não podia conter, mas o corpo sentia-se grato e deixou de tentar perceber.
Da casa começa a sair música como fumo de um incêndio. A milonga fê-la sorrir. O navio revelou-lhe uma nova paixão, a dança. Cada dia era um longo hiato que a separava da noite e do palco. Em Buenos Aires descobriu o tango, como se tivesse passado a vida à sua espera. Algumas lições, e rapidamente se tornou o epicentro dos salões de dança. Foi quando deixou o cantor.
Um vulto aproxima-se dela e passa-lhe a cuia do mate. Acordou hoje ao lado deste corpo, as pernas longas e lisas, um seio a espreitar por entre os lençóis. Encolheu os ombros, o corpo sentia-se grato…