1990. Foi há oito meses.
Berlim-Este é uma ilha. Já sabia que era um enclave na Alemanha Democrática, mas só agora consigo perceber a sua insularidade. Uma ilha sem mar rodeada de paredes. Opressivas, concentracionárias. Os berlinenses deste lado viveram esse peso, essa liberdade condicionada, à sua maneira, agarrando a vida mais intensamente que em qualquer outro lugar, saboreando cada golfada como se fosse a última e não houvesse amanhã.
A cidade aqui é diferente, apresenta uma prosperidade que parece exagerada, ostensivamente luxuosa. De manhã, vindos do tal lugar de campismo, percorremos bairros enormes de prédios cinzentos e monótonos, quase sem lojas, sem cafés nem restaurantes, estranhamente silenciosos e vazios.
Entrámos em Berlim ocidental por um dos checkpoints, aberto e sem guardas, mas intacto, com as suas gaiolas de rede onde as pessoas esperavam a possibilidade de passagem. Procurámos o famoso checkpoint Charlie, estava já quase todo destruído. Passámos o dia deste lado. Do alto do edifício Mercedes consegue-se perceber a cidade. E o Muro, agora já com brechas em muitos sítios. Nuns lugares dá a impressão que a cidade está semeada de baldios, noutros, que é um enorme estaleiro onde se constroem prédios ao ritmo exacto e metódico dos alemães. Toda a cidade está em obras e as gruas enchem o horizonte como pontos de exclamação.
Num desses terrenos erguem-se estruturas metálicas, uma delas parece um enorme palco. Ficámos curiosos. Indagámos. Vai haver um concerto enorme “The Wall” dos Pink Floyd junto à Potsdamer Platz. O quê, mas isso é já amanhã! Voámos dali para fora, bilhetes, onde é que se vendem bilhetes? Sim é aqui, mas estão esgotados. Esgotados??!! Esgotadíssimos.
À noite, o regresso, ao tal lugar de campismo, foi quase tão triste como aqueles bairros enormes e escuros, espectrais, iluminados por lâmpadas envergonhadas de tão fracas que se enforcavam nos raros candeeiros que nem chegavam a pontuar as ruas.
9 comentários:
Checkpoint Charlie...
http://www.youtube.com/watch?v=AouNl1ts20E&feature=related
Sim, agora é tempo de termos o link dos Pink Floyd - Berlin'90, já o colocaste e muito bem. Seria memorável para ti se conseguisses ver esse concerto.
Mais uma viagem em Berlim 1990:
http://www.youtube.com/watch?v=LAyFDXKuRyw&feature=related
Ao contrário do que acreditavam a maior parte dos cidadãos do Leste da Europa, o nosso lado não é o paraíso. O lado do sonho continua a existir apenas no interior das cabeças. Quando estive em Praga, ainda nos anos de chumbo, tive a oportunidade de explicar a alguns checos que nós tínhamos a liberdade política de sair do país e ir para onde nos apetecesse, mas que não tínhamos a liberdade económica, nem as estruturas de educação, saúde, etc. que eles dispunham.
É tudo relativo, para que serve a liberdade política a milhões de americanos pobres que nunca saíram do bairro onde cresceram e muitos nunca sairão?
Para mim, a queda da utopia deixou o mundo mais pobre e com a sensação de não haver alternativa aos regimes podres, corruptos e aparentemente democráticos.
Deixo um olhar sobre os alemães, dezoito anos depois da queda do muro.
http://www.youtube.com/watch?v=rbbWIRhJbgc
as imagens falam por si:
http://www.dw-world.de/popups/popup_imagegalleryimage//0,,1022436_gid_1022276_lang_5_page_1,00.html
He estado viendo tus entradas son el reportaje en Berlin, muy buen trabajo. Es increible que puedas encontrar muchas diferencias por las ideologías.
Abrazos
um clássico sobre tempo (d)e mudança
http://www.youtube.com/watch?v=j-bDMIy2FYQ
VAya...PF en 1990... Que envidia!
huy!!!
estas últimas entradas tuyas, de tan fascinates, de tan logradas, trasportan!! y poder darse un viajecito de estos, se agradece, de verdad
Bem. não retomaste exactamente onde tinhas ficado no último post.... faltou a descrição do tal parque de campismo.
Mas as fotos compensam esse pequeno esquecimento.
Sugestão: como era antes do outro lado do muro.
http://www.youtube.com/watch?v=xXLRvWKBl4w
beijos
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